O que significa ser professor na Alemanha
Estudo & Carreira

O que significa ser professor na Alemanha

Celso Celso Fernandes
6 de maio de 2013

Imagem: Pixabay

Muitas vezes quando estamos aprendendo um novo idioma, é comum encontrar palavras ou termos que são muito semelhantes a palavras no idioma Português. Por força desta coincidência acreditamos conhecer o real significado da palavra estrangeira e acabamos cometendo gafes. Tais termos são denominados de falsos amigos, justamente por causarem confusão. Eu vou falar um pouco mais sobre falsos amigos na minha série sobre Aprender Alemão (ela irá sair! Acreditem!), mas por hora eu gostaria de focar no significado apenas da palavra professor, já que muitos dos leitores do site visam estudar na Alemanha um dia.

A palavra professor ou ser professor na Alemanha é muito diferente de ser professor no Brasil ou em Portugal. No norte da Europa, a palavra professor tem um significado parecido com o significado no idioma Inglês. Na Alemanha, o título de professor é reservado, nas universidades, apenas a docentes seniores. Ao contrário do que acontece nos países de língua inglesa porém, a promoção ao nível de Professor requer que, além do grau acadêmico de doutor, o candidato passe também pelo processo de Habilitação, que normalmente exige a submissão de uma segunda tese e uma aula pública ministrada perante uma banca de especialistas. Em geral, são necessários vários anos de experiência profissional ou acadêmica após a conclusão do doutoramento para que um indivíduo se qualifique a obter uma Habilitação de professor.

Membros do corpo docente de uma universidade que possuem o grau de doutor, mas não passaram ainda pela Habilitação, são normalmente chamados de wissenschaftichler Assistent ("assistente científico") na Alemanha, não usando portanto a designação de "professores". Alguns estados alemães introduziram recentemente a posição de Juniorprofessor, equivalente ao Assistant Professor nos Estados Unidos, e prescindindo da necessidade de Habilitação.

Outra diferença é que nas grandes TUs (Universidades Técnicas) da Alemanha, os professores costumam ser seres quase intocáveis. Eles chegam, ministram a aula e logo depois somem de vista com a mesma rapidez com que apareceram. Durante a graduação, quase toda e qualquer dúvida que um aluno tiver, não será tirada com o professor diretamente e sim com o assistente do professor (geralmente um doutorando) ou até mesmo com o assistente do assistente (algum outro aluno de um semestre superior). O contato direto com professores é reservado, na maioria das vezes, aos doutorandos apenas. Nas Hochschule na Alemanha, aonde as turmas tendem a ser menores e o ensino costuma ser menos teórico, os professores são mais acessíveis.

Muitos (senão a maioria) dos professores na Alemanha são membros respeitados internacionalmente no ramo em que ensinam. Muitos possuem empresas própria e prestam consultoria para grandes multinacionais dentro e fora da Alemanha. Por este motivo, eles costumar tem agendas extremamente ocupadas e ouvir a opinião deles sobre determinados assuntos é um luxo que muitas pequenas empresas não podem pagar.

Meu primeiro trabalho na Alemanha foi de assistente num departamento da TU aonde estudava. Eu lembro que na época eu estava apenas começando a entender o nível e o tamanho do conhecimento das pessoas com que eu trabalhava todos os dias. Por eu vir de um país aonde a educação não possui o mínimo valor, eu confesso que vivi um certo choque após ter sido inserido, de repente, neste nível academico. Enfim...eu estava bem empolgado, pois pela primeira vez na vida percebi que é possível sim passar toda a vida estudando, pesquisando e ainda por cima ser bem pago por isso. Melhor ainda...sendo reconhecido por isso!

Eu levei toda esta empolgação comigo para o Brasil em 2009 e acabei decepcionando e chocando muita gente. Quando eu dizia para as pessoas que eu trabalhava num instituto auxiliando professores, eu sentia que as pessoas me olhavam com uma certa decepção. Quando eu dizia que queria trabalhar com pesquisa e com desenvolvimento, dava quase pra ver o ponto de interrogação flutuando sobre a cabeça delas. Perdi a conta de quantas vezes me disseram:

- Isto é muito abstrato. Por que você não volta para o Brasil e faz um concurso. A Petrobras está abrindo vaga para engenheiros! E aí eu tentava consertar dizendo:

- Para a Petrobras ganhar dinheiro ela precisa cavar buraco, não?!? Pra cavar buraco ela precisa de ferramenta, certo? Ualá! Então alguém em algum lugar, precisa pensar pra fazer estas ferramentas! Sacou??

Ainda assim, eu percebia que as pessoas não estavam 100% convencidas. Ninguém parecia entender que é possível ganhar dinheiro usando a cabeça, ao invés de passar o dia quebrando pedra. Progressista é o governo que estimula tais atividades e felizes são as pessoas que tem a sorte de nascer, viver e até morrer em tais regimes.

O processo de criar um produto e fazer dinheiro com ele, é muito mais complexo do que as pessoas imaginam e tem, para mim, um caráter quase místico e alquímico. O dinheiro é o produto da materialização de uma idéia. A maioria de nós simples mortais, ganha dinheiro apenas nas fases finais deste processo e por isso somos ignorantes sobre a verdadeira origem das coisas. Cada objeto, por mais ordinário que seja, tem uma história extra-ordinária para contar:

Num determinado tempo e espaço, existe uma necesidade ou surge um fenômeno. Um "João Ninguém" observa este fenomeno ou enxerga esta necessidade. Este "João Ninguém" sente a vontade de explicar este fenômeno ou achar uma solução para a necessidade. "João Ninguém" cria uma abstração ou um modelo da situação e desenvolve uma tese. "João Ninguém" passa noites em claro tentando provar a sua tese. "João Ninguém" tem sucesso e sua hipótese passa a ser universalmente aceita e transforma-se em uma lei. Através da sua lei, "João Ninguém" passa ser alguém e depois de morto ganha várias ruas com seu nome. Todo mundo concorda que ele era um grande homem (ou mulher) e ninguém mais discute a sua reputação. A Lei de João Ninguém (que agora não é tão ninguém assim) passa a ser usada por N pessoas como base para criar centenas de soluções básicas ou máquinas simples de baixo valor agregado. Estas máquinas simples podem ser combinadas para gerar outras máquinas ou soluções complexas com alto valor agregado. Estás máquinas ou soluções de alto valor agregado recebem um facelifting através de um trabalho de Marketing e passam a ser produtos altamente procurados no mercado, gerando milhões em vendas. Mas para tudo isso ser possível, o nosso "João Ninguém" teve que pensar. De fato, o passo mais difícil de todo este processo, é o primeiro passo: A Observação e abstração do problema. Tal tarefa pode ser realizada apenas por pessoas com alto grau de inteligência e poder de percepção. A dificuldade de observar e captar é tão difícil, que no curso da história apenas grandes gênios conseguiram. Exemplos?

Newton, por exemplo. Observou a queda de um objeto, meditou sobre o assunto, criou uma hipótese, provou suas hipóteses e deu origem as Leis de Newton. Mais tarde suas leis foram usadas para calcular o funcionamento de máquinas simples que por sua vez fizeram possível a viagem espacial (pelo menos em velocidades abaixo da velocidade da luz e longe da vizinhança de corpos de grande massa, onde tempo e espaço começam a perder sentido e as Leis de Newton perdem validez...bahhh!), o carro e tudo mais que você possa imaginar.

Outro exemplo? Kirchhoff. Através de suas observações, ele criou uma hiopótese que deu origem as Leis de Kirchhoff. Se você não sabe o que é Lei de Kirchhoff, então faça um favor para si mesmo(a) e vá estudar. Mas vou deixar aqui a dica: Você provavelmente não estaria lendo este post, caso esta Lei não tivesse sido formulada. :-P

Bom, de acordo com as minhas observações, é mais ou menos assim que eu defino um produto. Não vou esconder que adoraria ter sucesso nas fases finais do processo, gerando milhões em vendas para mim mesmo. Não vou negar, porém,  que a glória está em plantar a primeira semente.

Ihh...falei demais. tchau!

 
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Celso Fernandes
Celso Fernandes
Autor
Engenheiro, empreendedor e programador de fim de semana.  Natural de Petrópolis, RJ. Trinta e poucos anos de idade e há dez anos vivendo na Alemanha. Escreveu o primeiro post no Batatolandia em 2008 e desde então não parou mais.

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